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Editorial

O ano da morte de João Cancela

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Faleceu João Cancela. Um verdadeiro audiófilo. Um visionário. Um mentor. Um amigo. Que descanse em paz.

Conhecia João Cancela há 40 anos. A nossa amizade sincera acompanhou toda a minha carreira de crítico de áudio, que ele apoiava com entusiasmo e profundo conhecimento de causa; e também a sua evolução como um dos principais distribuidores de equipamento de áudio highend, em Portugal.

João Cancela foi o meu mentor audiófilo, pois soube despertar em mim a paixão pelas artes do som. Vendeu-me, aliás, o meu primeiro amplificador highend: um Threshold S200, com o famoso andar de potência Stasis, concebido por Nelson Pass.

Ainda me lembro do seu orgulho, quando me informou que tinha fundado a Esotérico, Consultores de Som, e pretendia tornar-se o distribuidor da NAD, uma marca que sempre o acompanhou, e que foi objeto da minha primeira crítica, sob o título “Um som daNADo”, então publicada no suplemento “Êxito” do Correio da Manhã.

Ao contrário da Jeff Rowland, que ambos descobrimos nas “Journées de la Haute Fidelité”, em Paris, e que o traiu, depois de um notável trabalho de promoção, num país que, só então, despertava para o highend. Quando anos depois, em Las Vegas, mostrei a Jeff Rowland o meu desagrado pela atitude, já Jeff compreendera o erro que cometera. Too late.

João Cancela tinha um faro muito especial para produtos desconhecidos de elevado potencial, como a Halcro, embora nem todos tivessem tido grande sucesso no mercado. E, quando os adotava, defendia-os como se fossem únicos, fazendo o gesto muito característico de beijar as pontas dos dedos em flor.

Viajámos juntos dezenas de vezes, não só para Paris, mas para Londres, Frankfurt, Munique, Nova Iorque, Las Vegas, sempre com o objetivo da descoberta de novos negócios para ele, e de notícias exclusivas para mim.

Nas nossas viagens, vivemos muitos episódios curiosos, que nos ficaram na memória. Como quando, ao fazer o registo de entrada da reserva que partilhávamos num hotel em Londres, foi-nos dada a chave de um quarto que ainda estava ocupado. Quando abrimos a porta, deparámos com um casal na cama, em plena atividade. Fechámos a porta sub-repticiamente, e eles nem deram por nada. Passámos o dia a rir por causa deste acontecimento. A partir daí, batíamos sempre à porta primeiro, e ríamos como dois adolescentes…

João Cancela não tinha todos os dedos na mão direita, nunca lhe perguntei o porquê, por uma questão de respeito pela sua privacidade. Ou talvez porque ele tinha o aperto de mão mais firme, mais convicto, mais honesto, mais sincero de todas as mãos que já apertei. Era esta capacidade para ultrapassar qualquer adversidade com convicção e energia que o distinguia como pessoa.

E o sorriso enigmático. O humor fino. A ironia polida. Vou sentir a sua falta. Muito.

João Cancela (à dir.): a arte de saber receber, o sorriso, o humor, a convicção nas palavras e nos atos.

João Cancela (à dir.): a arte de saber receber, o sorriso, o humor, a convicção nas palavras e nos atos.

É verdade que a maldita doença, que nos rouba até o direito de reconhecermos os outros e a nós próprios, já o tinha roubado também ao nosso convívio nos últimos anos. Mas Deus decidiu agora levá-lo para descansar junto d'Ele.

Que descanses, pois, finalmente em Paz, meu querido amigo.

No meu nome, da minha família e do Hificlube, apresento as mais profundas condolências à esposa, Teresa, aos filhos, familiares, amigos e colaboradores das empresas Esotérico e Smartaudio.

José Victor Henriques

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João Cancela (à dir.): a arte de saber receber, o sorriso, o humor, a convicção nas palavras e nos atos.


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