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Reviews Testes

MrSpeakers Ether Flow O e Flow C

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Que um fabricante de auscultadores se chame MrSpeakers parece-me ser uma ironia. Já Ether e Flow têm ambas razão de ser: a primeira, por uma questão filosófica; a segunda, por razões técnicas.

Ether, cujo correspondente em Português é ‘Éter’, não tem claro nada a ver com o composto orgânico extremamente volátil utilizado para desinfectar feridas, mas com o ‘Éter’ mitológico que personificava o conceito de ‘Céu’ ou ‘Ar’ que os deuses do Olimpo respiravam; e que mais tarde evoluiu para o conceito de ‘vácuo’ na natureza e até há pouco tempo era utilizado para designar o ‘espaço’ no qual se transmitiam as ondas electromagnéticas, como as ondas de rádio, por exemplo. ‘It makes sense’, portanto.

Já ‘Flow’ é muito utilizado em electroacústica, para designar a eliminação da turbulência nos ‘pórticos’ reflex das colunas de som. Aqui designa a tecnologia criada por Dan Clark para ultrapassar um dos principais ‘obstáculos’, literalmente, da tecnologia planar-magnética.

Para fazer vibrar uma membrana ultrafina tornada condutora (por meio de uma espiral ou serpentina) à passagem de uma corrente gerada pelo sinal áudio, é preciso colocá-la num campo magnético de uma estrutura composta por uma ‘sanduíche’ de magnetos ou ímanes de neodímio que a movimentam por atracção magnética produzindo som.

Ora os ímanes colocados atrás e à frente da membrana são de metal, logo constituem um obstáculo à passagem do som produzido pela vibração. Assim, por que não ‘perfurá-los’, criando um ‘pórtico’ para a passagem do ar, logo do som? Seria a melhor forma de aproximar os transdutores planares dos electrostáticos, cuja membrana está colocada entre duas placas finas de metal perfuradas (eléctrodos) em vez de um ‘muro’ de ímanes com frestas.

Bem dito, melhor feito: e nasceu a tecnologia ‘Flow’, que permite ao diafragma dos auscultadores ‘respirar’ com mais ‘fluidez’. Vejam em baixo o vídeo que ilustra o princípio ‘Flow’.

Finalmente o ‘O’ e o ‘C’. Nesta análise, fiz uma comparação auditiva entre o modelo Flow O aberto, isto é ‘dipolar’ e sem caixa acústica de absorção da onda traseira (bi-lateral, neste caso); e os Flow C, fechados com caixa de fibra de carbono.

A MrSpeakers é a mais recente ‘player’ no mercado em forte expansão dos auscultadores ‘highend’ que utilizam a tecnologia planar-magnética, isto é, em vez de altifalantes dinâmicos convencionais, apenas uma membrana ultrafina, tal como os electrostáticos, mas sem a necessidade de um amplificador dedicado para elevar a tensão até aos 5 mil volts, sendo compatíveis até com um smartphone.

Digamos que este tipo de auscultadores é uma miniatura das famosas colunas Magneplanar, cujo painel funciona segundo o mesmo princípio, enquanto os Stax funcionam segundo o princípio das famosas Quad electrostáticas.

Arte ortodinâmica

Há também quem lhes chame isodinâmicos ou ortodinâmicos. Estiveram na moda nos anos 70, mas devido ao peso e à baixa sensibilidade caíram em desuso, tendo renascido em força nos últimos cinco anos graças aos esforços de companhias como Audeze, Abyss, Hifiman e Oppo, entre outras, apesar do elevado preço de alguns modelos, que tem vindo a baixar, tal como o peso, ao mesmo tempo que a qualidade do som se aproxima e, em alguns casos – o grave, por exemplo - é superior ao do reproduzido pelos Stax electrostáticos.

MrSpeakers AEON (open)

MrSpeakers AEON (open)

Actualmente, pode comprar auscultadores planar-magnéticos por preços que variam entre os 500 e os +5000 euros. A MrSpeakers, além destes dois modelos, cujo preço é relativamente elevado (€1999), comercializa também o Aeon Flow O e C por uns razoáveis 899 euros. Mais leves (300 gr.), mais ‘doces’ e mais ‘transportáveis’.

A Mr.Speakers, além destes dois modelos, cujo preço é relativamente elevado (€1999), comercializa também o Aeon por uns razoáveis 899 euros.

Claro que o desempenho será tanto melhor quanto mais qualidade tiver o amplificador/DAC. Mais ainda se tiver saídas balanceadas. Contudo, um DAC/amp como o excelente Chord Hugo 2, que utilizei nesta comparação, mesmo não sendo balanceado, já consegue obter um desempenho excelente de ambos os modelos em análise. E foi esse o caso, tendo como pano de fundo os Hifiman HE 1000 (a minha actual referência e mil euros mais cara) e as notas de audição dos Hifiman X e Audeze LCD3 e Oppo.

Nota: Na secção ‘Artigos Relacionados’ em baixo podem aceder aos testes já publicados pelo Hificlube de todos estes modelos de auscultadores planar-magnéticos da Audeze, Hifiman e Oppo.

Um gosto adquirido

A audição com auscultadores planar-magnéticos é um gosto adquirido – e um hábito difícil de abandonar. O som é de uma maneira geral orgânico e natural, ‘amplo´, sobretudo com os modelos ‘abertos’, e pouco colorido na gama média; o grave tem incrível extensão (tensão nem tanto) e apenas o agudo não atinge ainda a perfeição electrostática e pode em raras circunstâncias soar como ‘papel de arroz’ para alguns ouvidos mais exigentes.

A audição com auscultadores planar-magnéticos é um gosto adquirido – e um hábito difícil de abandonar.

Só que depois de os experimentar quase todos os auscultadores dinâmicos lhe vão soar ‘artificiais’ e cansativos ou então ‘fechados’ quando não mesmo ‘opacos’ e claustrofóbicos, enquanto os electrostáticos lhe vão soar ‘anémicos’.

Cada cabeça sua sentença

Há quem os ache lentos e balofos mas isso depende em grande parte da amplificação, pois precisam de muita energia para dar o seu melhor. Ou então há também quem ache alguns modelos demasiado vivos, quando não mesmo ‘confusos’ no agudo devido ao grão, opinião que eu não partilho. A afinação ou tempero varia muito de fabricante e de modelo, pelo que deve sempre experimentar antes de julgar ou comprar.

Até porque, ao contrário das colunas de som, o mesmo modelo do mesmíssimo fabricante pode soar também completamente diferente de pessoa para pessoa, dependendo por exemplo do formato e relevo do seu pavilhão auricular, tanto ou mais quanto da sua acuidade auditiva. Sobretudo no agudo, pois o grave encontra sempre outras formas de se transmitir até lhe chegar ao cérebro.

Digamos que os auscultadores planar-magnéticos têm todos de uma maneira geral um carácter sonoro semelhante mas personalidades diferentes para a qual também contribui muito o design, a construção e o conforto.

Os Audeze, por exemplo, soam de uma maneira geral mais ‘quentes’ cheios e encorpados, quase carnudos; enquanto os Hifiman são mais transparentes, abertos, expansivos nos extremos de frequência e neutros na gama média, podendo soar algo secos para algumas sensibilidades audiófilas, muito em função da amplificação, claro está. E também da forma como a sua cabeça/orelhas se adaptam a eles – daí as enormes diferenças de opinião e/ou gosto pessoal…

MrSpeakers Ether Flow e Flow C

Mr Speakers Ether Flow O e C

Mr Speakers Ether Flow O e C

Resolvi fazer um teste duplo porque o Flow e o Flow C são 90% idênticos: a mesma tecnologia de transdução, o mesmo diafragma V-Planar de superfície frisada como a dos ‘ribbons’, a mesma estrutura magnética, a mesma estrutura de suporte em metal leve e até as mesmas almofadas em pele de cordeiro italiana, que são mais largas atrás e mais finas à frente para obter o ângulo de ataque ideal.

As cápsulas são redondas e enormes, do tipo circumaural, abarcando toda a orelha praticamente sem lhe tocar, com um mini pórtico ‘reflex’ oblongo no topo (tape-os com o dedo indicador e vai ouvir uma diferença subtil na extensão e tensão do grave e menos ar em redor das vozes).

Além da embalagem externa em papelão, os Ether Flow apresentam-se numa caixa de transporte que parece uma luva de boxe e cumpre os necessários índices de protecção em viagem.

Os Flow vinham acompanhados por cabos de 1,80 com jack de 6,35mm ou XLR de quatro pinos (balanceado, não utilizado neste teste). Não sei se este é o cabo Premium DUM (‘Distinctly Un-Magical’, mais uma ironia de Dan Clark que acha que os cabos exóticos são isso mesmo: fantasias).

Aquilo que os diferencia é a caixa aberta dipolar com um ‘anel’ em azul cobalto (os do Ether original eram em vermelho) e a grelha de favos hexagonais do Flow O, provavelmente concebida por uma impressora 3D, e que me parece ser a única peça em plástico do conjunto; e a caixa fechada em fibra de carbono do Flow C.

A entrada do sinal faz-se por uma ficha de 4-pinos Isamwoo SN-8-4(P), que só se torna fácil de colocar quando se percebe que se deve rodar a ficha interior e não a braçadeira exterior rotativa.

O conforto que ambos oferecem é igual. Mesmo quem usa óculos vai achá-los confortáveis. Se fechar os olhos e pedir para os colocarem na sua cabeça, só vai saber qual é qual quando começar a tocar, pois são fáceis de distinguir de ouvido.

Ambos os Flow encaixam muito bem na cabeça e a colocação é firme sem ser demasiado apertada. Já o peso, apesar de bem distribuído lateralmente, mais tarde ou mais cedo vai acabar por sentir as 400 gr. no topo da cabeça. Mas todos os planar-magnéticos são assim pesados por natureza, alguns chegam mesmo a pesar +600 gr!

Os ‘sliders’ de ajuste deslizantes – e sem passos fixos - são muito eficientes e firmes e – alegadamente – o metal da estrutura em NiTinol tem ‘memória’. Mas isso já são as maravilhas do ‘marketing, que não comento...

Quase não há diferenças entre eles: o preço (€1999) é igual para ambos; o peso também (+/-400 gr). Assim como a sensibilidade declarada (96dB/mW), embora o Flow O toque ligeiramente mais alto que o C com o mesmo nível de sinal, o que também significa que, numa comparação A/B directa, o Flow O pode soar invariavelmente ‘melhor’, quando afinal soa apenas ‘maior’.

A principal diferença reside, pois, no SOM. Em princípio, só devia haver um SOM absoluto, pelo que todos deviam soar iguais. Hèlas, tal como na vida e na política, alguns soam mais iguais que outros.

…o Flow C tem um som mais limpo, neutro e seco; e o Flow O é mais expansivo tanto na reprodução como na amplitude da imagem…

Em poucas palavras, eu diria que o som do Flow C, talvez por ser fechado, logo com melhor isolamento do som ambiente, é mais limpo, neutro e seco; enquanto o do Flow O é mais expansivo, tanto na reprodução das texturas como na amplitude da imagem, embora o feltro da grelha os torne semi-abertos. Quase me apetecia substituí-lo por algo mais, digamos, diáfano.

Mas a ‘grelha’ interior, por trás da espuma, é igualmente bastante fechada apesar dos 8 grupos de 16 orifícios da estrutura que suporta os ímanes. A vantagem é que, apesar de ser aberto o Flow O não ‘derrama’ tanto som para o exterior como os Hifiman, por exemplo, que se ouvem pela casa toda à noite.

Cada Flow seu paladar

MrSpeakers Ether Flow O (€1999)

MrSpeakers Ether Flow O (€1999)

O Flow O soa mais encorpado, com ‘cores’ mais saturadas e um ligeiro ênfase na gama média-baixa que lhe confere uma agradável estrutura musical e dá ‘peito’ e autoridade às vozes masculinas, com bom controlo da sibilância das vozes femininas, enquanto o grave tem mais peso mas menos recorte que o do C, devido a alguma promiscuidade assumida na fronteira entre o grave superior e o médio inferior. O agudo é também mais discreto ( O C é mais brilhante) mas sem perda de informação importante.

A gama média do C é subjectivamente mais recuada na zona de presença, e por isso o agudo fica mais exposto no equilíbrio tonal. A colocação de filtros de espuma muito fina (fornecidos) no interior das almofadas atenua o agudo em 2dB e o grave ganha mais corpo em consequência, sem perda de recorte e articulação, mas pode interferir com a qualidade da gama média por efeito de ‘véu’. No pain, no gain. Não deixe, contudo, de fazer a experiência, pois é muito interessante. Vai ficar dividido como eu. É provável que acabe por deixar lá o filtro…

MrSpeakers Ether Flow C  €1999 (com cápsulas protegidas por fibra de carbono)

MrSpeakers Ether Flow C €1999 (com cápsulas protegidas por fibra de carbono)

Para audição crítica eu prefiro o Flow C, porque a ‘neutralidade’ ambiental potencia a ilusão subjectiva de maior resolução; para audições prolongadas o Flow O soa mais ‘cheio’ com uma ilusão subjectiva de maior imersão espacial, de ‘estar lá’, sobretudo nos concertos ao vivo, de música clássica e bandas sonoras de filmes.

Gosto sobretudo da naturalidade das vozes nos diálogos fruto da maior frontalidade da gama-média que favorece o foco central (o C é subjectivamente mais ‘recuado’ nos médios por efeito da opção pelo ênfase no grave e agudo em detrimento dos médios).

Dentro da sua gama de preço (são ambos produtos de luxo de categoria high end ), são concorrentes directos dos modelos correspondentes de outros fabricantes (como os acima referidos), que utilizam a mesma tecnologia de transdução, e devem obrigatoriamente fazer parte da sua lista de audição prévia, não só pela elevada qualidade do som mas pela excelência da construção e o conforto de utilização, e levam por isso uma forte recomendação do Hificlube.

Alguns exemplos práticos da audição:

Humble, Kendrick Lamar, Damn

Flow O - Percussão electrónica pulsante e cheia, carnuda. Instrumentos sintetizados bem definidos na mistura. Voz de Lamar presente e inteligível apesar do traço mais grosso. Coros com uma crista de artificialidade que não é defeito do Flow mas da produção. Efeitos espaciais dos silvos de sintetizador convincentes e espectaculares.

Flow C – Voz de Lamar mais limpa com menos corpo e melhor enfoque. As ‘explicit lyrics’ são mais…eh… explícitas no sentido e menos implícitas no sentimento de raiva. Percussão electrónica mais impactante mas menos pulsante. Efeitos espaciais menos marcados e mais ‘juntos’ à cabeça.

Green Light, Lorde, Melodrama

Flow C - Estrutura bem marcada da percussão electrónica não afecta a presença da voz de Lorde em primeiro plano, que soa isolada na mistura quase acapela sobre um manto de notas sintetizadas de piano. Coros confusos e espalhafatosos não afectam inteligibilidade da voz de Lorde. Devido à sensibilidade mais baixa, é preciso subir um pouco o volume para compensar.

Flow O – Grave tem menos extensão e articulação, o Flow C tem mais ritmo e extensão. Voz mais quente e sensual de Lorde. Forte efeito de espacialidade que torna os coros fortemente processados mais aceitáveis. Audição mais confortável para quem pretende ouvir o disco todo de uma vez.

If You Wait, London Grammar, If You Wait

Flow O – Excepcional reprodução da reverberação electrónica de estúdio. Excelente projecção da voz. Piano harmonicamente credível. Substrato de baixa frequência podia ter mais profundidade. Não confundir intensidade com extensão.

Flow C – A reverberação electrónica está lá mas perde-se a ambiência e a espacialidade. Som mais seco sem o efeito secundário do ênfase do Flow O no médio superior. A voz e o piano soam mais definidos mas com menos ‘carne’ harmónica no conjunto da estrutura tonal. Substrato de cordas graves sintetizadas com linhas mais definidas, menos intensas mas mais tensas e extensas.

Ina Forsman, I Want a Little Sugar in My Bowl, Ina Forsman

Flow C e O – O Diabo que escolha! O piano, Ina e o sax soam todos maiores mas menos focados com o Flow O, talvez por ter mais informação espacial. Não é fácil escolher entre os tons mais quentes do O e os mais frios do C. O Flow O tem por vezes um vibrato quando o som sobe que não oiço no C, talvez porque as conchas de fibra de carbono são menos propensas a vibrações que a grelha do Flow O. A partir de uma certa altura, só a interpretação de Ina Forsman interessa. E é excepcional com ambos.

The Nightfly, Donald Fagen, The Nightfly

Flow C e O – Eis um dos casos em que os ‘tuning pads’ do Flow C podem fazer a diferença entre um som excessivamente seco e outro com melhor tempero. A linha do baixo tem melhor definição, ritmo e recorte com o Flow C. De resto, soa tudo melhor com o Flow O, apesar do som de estúdio sem espacialidade ou reverberação. Ou talvez por isso.

Haydn, Violin Concertos, Isabelle Faust

Flow C e O – O Flow O ganha ‘hands down’. O Flow C é mais transparente e claro e tem melhor definição, mas a ‘coloração’ é mais dura e fria (utilize os ‘tuning pads’ para compensar). Se gosta de ouvir as peças seguindo a partitura, opte pelo C. Se gosta de se perder na beleza da obra, opte pelo O. Nenhum deles é perfeitamente neutro. Têm apenas colorações opostas. À chacun son goût…

Está confuso? Também eu. Olhe compre os dois…A diferença é entre branco (Flow C) para acompanhar pratos mais ligeiros e rápidos: pop, rock e jazz; e tinto (Flow O) para pratos com mais substância como as grandes orquestras, bandas sonoras e concertos ao vivo. Na dúvida, opte sempre pelo tinto: é mais macio e tem mais fruta. Mas atenção: os auscultadores abertos também se ouvem fora da sua cabeça. São uma espécie de bebedeira acústica que pode incomodar os outros…

Vá ouvi-los na Ultimate Audio e decida por si. Os ouvidos são seus, a carteira também.

Ether Flow e Flow C copy

MrSpeakers AEON (open)

Mr Speakers Ether Flow O e C

MrSpeakers Ether Flow O (€1999)

MrSpeakers Ether Flow C €1999 (com cápsulas protegidas por fibra de carbono)


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